domingo, 22 de julho de 2012

Poema ao Poeta Banido


Quando penetrou em sonho
Na cabana dos poetas banidos, vizinha
À cabana dos mestres banidos (de onde
Ouviu briga e gargalhada), veio-lhe ao encontro
Ovídio, e disse-lhe a meia voz:
“Melhor não sentares. Ainda não morreste. Quem sabe
Ainda não retornas? E sem que nada mude
Senão tu mesmo.” Porém, consolo nos olhos
Aproximou-se Po Chu-yi e disse sorridente: “O rigor
Fez por merecer todo aquele que uma só vez deu nome à
injustiça.”
E seu amigo Tu-fu disse suave: “Compreendes, o desterro
Não é o lugar onde se desaprende o orgulho.” Mas, mais terreno
Interpôs-se o maltrapilho Villon, e perguntou: “Quantas
Portas tem a casa onde moras?” E tomou-o Dante pelo braço
E levando-o para o lado murmurou: “Teus versos
Estão cheios de erros, amigo, considera
Quem está contra ti!” E Voltaire berrou de lá:
“Cuida dos tostões, senão te matam de fome!”
“E usa gracejos!”, gritou Heine. “Não ajuda”,
Esbravejou Shakespeare, “Quando veio Jacó
Também eu não pude mais escrever.” – “Se houver processo
Toma um patife como advogado!” Aconselhou Eurípedes
“Pois ele conhece os furos nas malhas da lei.” A gargalhada
Ainda soava, quando do canto mais escuro
Veio um grito: “Escuta, sabem eles também
Os teus versos de cor? E eles que sabem
Escaparão à perseguição?” – “Estes são
Os esquecidos”, disse Dante em voz baixa
“Foram-lhes destruídos não só os corpos, mas também as
obras.”
A gargalhada cessou. Ninguém ousou olhar na direção. O
recém-chegado
Empalideceu.

Bertold Brecht


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